quarta-feira, 18 de maio de 2011

Despedida

Ele estava prestes a se casar.
Mais uma semana e chegaria a cerimônia.
Antes, decidiu passar uma divertida despedida de solteiro.
Beber, comemorar e brincar, despreocupadamente.

Após a festa, voltou para casa.
Mas não retornou só.
Chamou uma amiga colorida,
Afinal a casa estaria livre no fim de semana.

Fizeram de tudo, como se fosse a última vez,
Pois, no outro fim de semana,
Seria um homem casado.
O clima frio sequer atrapalhou:
O calor do chuveiro
E dos dois corpos juntos
Foram responsáveis por esquentar tudo.

A noite prometia.
Melhor impossível.
Um tempo para não pensar em nada sério,
Não se responsabilizar por nada,
Apenas a despedida.

Após o final do fim de semana,
Os pais do rapaz retornaram de viagem.
Todos estavam envolvidos naquela semana
Que seria decisiva, marcante.

Decisiva foi sim, mas por outro motivo:
Um flagra mudou radicalmente os espíritos.
Deitados na cama,
Estava o casal de jovens.

Após comemorarem a despedida,
Da solteirice dele e das noites de farra dela com ele,
Celebraram também a morte de ambos,
Que, ao não atentarem ao vazamento de gás,
Do sistema de aquecedor do chuveiro, durante toda a madrugada,
Mataram a si próprios,
Silenciosa e tragicamente.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Amigo do trabalho

Ele entrou na sala de bate papo virtual.
Objetivo: garantir a diversão da noite seguinte.
Até que encontrou aquele que pareceu um cara quente.
Há cinco anos pratica esta modalidade de "sexo fácil".

Encontrou um perfil interessante,
Forte, não tão alto. Tatuado.
Mais velho e vivido.
Pela conversa, um homem muito centrado.

Marcaram um papo real e inicial no shopping.
Ao se depararem, viram que as características
Além de combinarem, agradavam mutualmente.
Eram ambos negros, com diferenças de idade apenas.

Conversa vai,
Aparece a hora dele avançar e, talvez, sair dali,
Para convidar seu novo amigo
Ao famoso "lugar mais a vontade".

Antes que ele jogasse sua proposta,
Seu pretendente, de frente pra si, à mesa, na praça de alimentação,
Acena para alguém do outro lado.
Lá está uma garota que sorri, estranhamente, respondendo-o.
Ela estava levemente estressada, como quem está na correria.

Ela chega à mesa já perguntando:
"É este, então?"
"Como assim?", rebate o pretendente.
"É este o cara da internet?"
"Que cara? Ele é meu amigo do trabalho."
"Eu sei que é a bixona com quem você tá saindo!"

Surpreso, ele percebe que (já) está envolvido
Em um barraco em público.
O cara da internet,
Além de atirado, é casado. E com uma mulher.

"Quem é você? Tá saindo com meu marido?"
Ele, sem querer envolver-se, lança leve ironia:
"Desculpa, não te conheço."
"Responde! Você sai com ele?"
Sem reação, resolveu repetir a mesma desculpa ouvida anteriormente:
"Sou amigo dele, sou do trabalho."

Um tapa dela na cara dele, mostrou que a moça não acreditou naquilo.
Envergonhado, ele levanta-se e sai,
Deixando a menina prestes a sair correndo atrás dele,
Mas, por alguma razão, prefere ficar berrando a todos,
"Volta aqui, cara! Se quer meu marido, pode ficar.
Este canalha é inteiro seu!"

Por fim, na enfermaria, ele teve de explicar a história ao segurança,
Para registrar ocorrência,
Enquanto a enfermeira fazia curativo no rosto,
Marcado com um vergão,
Vindo da aliança
Da mão da garota,
Mulher do cara,
O maduro que acabara de conhecer,
Da internet.

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Saudades

Ela, na fase adolescente,
Vivia de som alto em casa,
Cantando (gritando) junto com aquele menino no áudio.
Ele é sensação mundial.

Sua mãe, impaciente e sem conseguir concentrar-se,
Gritava em outro tom à filha, para que desligasse aquilo.
Ameaçava quebrar o som, quebrar a música (!)
Mas nada interrompia a empolgação, nem a cantoria.

Nestes dias de perda,
Em que sua adolescente teve a vida levada
Por um criminoso que utilizou a escola fluminense
Para cenário de filme de horror,
A mãe nunca desejou tanto ouvir o som alto em casa de novo.
Daria tudo para ter a filha gritando pelos cômodos.

sexta-feira, 6 de maio de 2011

Mãe

Tornou-se uma pessoa frágil.
Mas uma pessoa que amou em sua juventude,
E, depois, em seu desamor,
Perdeu até o amor próprio.

Casou-se, sem saber ao certo o motivo.
Descasou-se de mesma maneira,
Quando tudo já estava fora do controle,
Perdendo tudo, inclusive a paz de espírito.

Entre as perdas, os filhos.
Aos quais nunca pode dedicar-se totalmente:
Apenas em raras fases de tranquilidade,
Quando a cabeça não estava perturbada,
Quando o espírito não estava por demais inquieto.

No ápice de atitude de um mundo esquizofrênico,
Até abandonava seus pequenos em lugar qualquer,
Tendo-os de volta, quando um conhecido os encontrava
Chorando, em algum lugar da Cidade.

Crises seguidas.
Foi perdendo controle de tudo,
Brigava com aquele que jurara amor até a morte,
Esteve a ponto de traumatizar os filhos,
Mas foi detida antes disso.
Ou talvez nem o faria, talvez.

Sem opções, se viu obrigada a ir sozinha
Para a terra onde nasceu,
De volta à casa dos pais,
Velhos, logo a deixariam solitária, novamente.

E solitária viveu eu sua inquietude,
Sempre consigo mesma, até a hora da partida,
Quando não havia mala, nem saúde,
Sequer haviam seus filhos ao redor,
Somente ela mesma
E sua mente, seu mundo a parte,
Sua loucura.

terça-feira, 3 de maio de 2011

Impaciência

O motorista senta na cadeira,
Prepara-se e inicia a condução do ônibus.
Assim que o carro sai do ponto, um senhor faz sinal para ele,
Por pouco não perdia aquela linha.

O passageiro entra e passa seu cartão, o ônibus sai.
O cartão não funciona. Ele tenta novamente. Nada.
Recorre ao motorista, que há pouco abrira a porta a ele,
Mesmo fora do ponto.

“Motorista, meu cartão não funciona.”
“Tentou passar de novo?”
“Sim, tentei.”
“Você não teria utilizado ele há menos de 30 minutos?”
“Sei lá, eu quero passar!”

Esta resposta, atravessada,
Foi suficiente para desencadear ira no motorista.
“Você espera meia hora e a catraca libera.”
Ao que o passageiro, também estressado, responde:
“Não quero nem saber: vou passar!”
“Ah, não vai não, seu filho ******...”

Enquanto este breve desentendimento ocorria
Todos os (muitos) passageiros assistiam à cena incrédulos.
O bate boca repetitivo estendeu-se.

Até que o motorista, tão bondoso,
Ao abrir a porta ao passageiro, mesmo fora de ponto,
Mostrou-se um homem bruto e sem respeito,
E exigiu que o outro pagasse em dinheiro.

E o passageiro,
Tão gentil em agradecimentos
Àquele condutor que lhe abriu a porta,
Mesmo fora do ponto,
Agora mostra-se ignorante e intolerante:
“Não vou mesmo! Tenho cartão, tenho dinheiro, você terá de aceitar.”

No auge da briga, o motorista para o coletivo e decide:
“Só por este desaforo agora você vai sair do ônibus!”
“Não vou mesmo, eu tenho dinheiro, você não pode fazer isso!”
“Ou sai ou eu não saio com o carro.”

E o ônibus está parado na avenida e tem suas luzes desligadas.
Agora os passageiros, que até então riam,
Passam a sentir-se afetados pelo desentendimento.
O motorista fica discutindo ali por mais uns cinco minutos.
O ônibus em silêncio, no escuro, e os dois a duelarem.

Após a cena patética, digna de dois irmãos de cinco anos,
O passageiro decidiu ceder e descer.
“Desço por vocês, passageiros, que têm pressa, e não por este idiota”,
Responde o homem, que ficou sem graça de ser, de certa forma,
Causador desta confusão.
Desceu e foi esperar o próximo carro da linha.
E o ônibus saiu.

Se o passageiro não tivesse sido tão duro em sua exigência,
A de passar com o cartão, mesmo sabendo que não devia,

Se o motorista tivesse tipo mais calma em responder à agressividade
Das palavras do passageiro, afinal tinha a razão,

Se ambos tentassem utilizar-se da comunicação,
Esta ceninha infantil não teria ocorrido.

Falta paciência, falta tolerância, falta ponderação.
Falta humanismo, falta cordialidade.
Falta bom senso, falta compreensão.
Falta colocar-se no lugar do outro.
Falta.