domingo, 6 de novembro de 2011

Divã

Ela chega, diz oi e pede licença,
Antes de perguntar sobre um itinerário.
Logo se dá por satisfeita:
Interrompe o informante,
Ficando, assim, sem a informação completa que "necessitava".

Como se a primeira pergunta fosse uma desculpa,
Um pretexto - uma batida na porta a espera de um "pode entrar!",
Ela se põe a desabafar ao informante.

O informante, este o deixa de ser, de imediato,
Passando a ouvir curiosamente os fatos,
Não sabendo se está admirado:
Com a simplicidade/banalidade do caso narrado,
Ou com a facilidade com que pessoas abrem suas particularidades
A estranhos.

Em menos de dez minutos
O ouvinte fica sabendo:
Que ela tem uma colega de trabalho que mente,
Que ela não gosta de ficar ouvindo as mentiras dessa colega,
Que ela acredita passar a ser co-autora da mentira da colega (ao ouvi-la),
Que ela não concorda com o fato de a colega entregar atestado médico falso,
Que ela entende, porém, que a colega precisa dar atenção a seu filho de 2 anos,
Que mora com a avó,
Que não tem pai,
Que este pai (do garoto de dois anos) era viciado em álcool,
Que é bom para ela (a colega) respirar um pouco, tirar um descanso,
Que ela não delatará a colega em seu dia de falta "por motivos de saúde"
E que, no fundo, essa colega não é daquelas que se podem confiar!

Ao se preparar para iniciar outro relato seu,
Agora sobre a própria filha,
Que está na puberdade,
Que quer namorar,
O ônibus que ela esperava chega.
Ela se despede e agradece, com um "Muito obrigada!".
Agradecimento.
Mesmo que a informação que ela pedira
Tenha sido dada incompletamente.

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Erro

Ela engravidou cedo, de forma inesperada.
Aceitou tudo. Assumiu, levou a gravidez adiante.
Não seria justo culpar o pequeno ser
Pela falta de juízo dela e do namorado.

Cultivou a gestação,
Fez planos diversos,
Esperou, às vezes paciente,
Às vezes na ansiedade total.
Como toda mãe o faz.

Chegou o dia do nascimento.
E mais espera e dores,
A necessidade da cesárea.
Parto tranquilo, afinal.
Um menino.

De volta à casa,
Após pouco mais de um mês
Do nascimento do filho,
Passou a sentir novas dores,
As dores que tivera no parto.

Estranheza e medo do incerto.
As dores persistiram.
Decidiu que iria ao hospital,
O Guilherme Álvaro, em Santos.
Unidade de referência, onde deu à luz.

Mas, antes mesmo da saída de casa,
Ainda no banheiro,
O sofrimento aumentou.
E para espanto dela eram contrações o que sentia.

Foi quando viu, ali no chão
Expulso de seu corpo,
Envolto em sangue e outros líquidos,
Um amontoado de gaze,
Que a fazia perceber,
Que a equipe que realizara seu parto,
Cometera nela
Um erro médico.

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Despedida

Ele estava prestes a se casar.
Mais uma semana e chegaria a cerimônia.
Antes, decidiu passar uma divertida despedida de solteiro.
Beber, comemorar e brincar, despreocupadamente.

Após a festa, voltou para casa.
Mas não retornou só.
Chamou uma amiga colorida,
Afinal a casa estaria livre no fim de semana.

Fizeram de tudo, como se fosse a última vez,
Pois, no outro fim de semana,
Seria um homem casado.
O clima frio sequer atrapalhou:
O calor do chuveiro
E dos dois corpos juntos
Foram responsáveis por esquentar tudo.

A noite prometia.
Melhor impossível.
Um tempo para não pensar em nada sério,
Não se responsabilizar por nada,
Apenas a despedida.

Após o final do fim de semana,
Os pais do rapaz retornaram de viagem.
Todos estavam envolvidos naquela semana
Que seria decisiva, marcante.

Decisiva foi sim, mas por outro motivo:
Um flagra mudou radicalmente os espíritos.
Deitados na cama,
Estava o casal de jovens.

Após comemorarem a despedida,
Da solteirice dele e das noites de farra dela com ele,
Celebraram também a morte de ambos,
Que, ao não atentarem ao vazamento de gás,
Do sistema de aquecedor do chuveiro, durante toda a madrugada,
Mataram a si próprios,
Silenciosa e tragicamente.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Amigo do trabalho

Ele entrou na sala de bate papo virtual.
Objetivo: garantir a diversão da noite seguinte.
Até que encontrou aquele que pareceu um cara quente.
Há cinco anos pratica esta modalidade de "sexo fácil".

Encontrou um perfil interessante,
Forte, não tão alto. Tatuado.
Mais velho e vivido.
Pela conversa, um homem muito centrado.

Marcaram um papo real e inicial no shopping.
Ao se depararem, viram que as características
Além de combinarem, agradavam mutualmente.
Eram ambos negros, com diferenças de idade apenas.

Conversa vai,
Aparece a hora dele avançar e, talvez, sair dali,
Para convidar seu novo amigo
Ao famoso "lugar mais a vontade".

Antes que ele jogasse sua proposta,
Seu pretendente, de frente pra si, à mesa, na praça de alimentação,
Acena para alguém do outro lado.
Lá está uma garota que sorri, estranhamente, respondendo-o.
Ela estava levemente estressada, como quem está na correria.

Ela chega à mesa já perguntando:
"É este, então?"
"Como assim?", rebate o pretendente.
"É este o cara da internet?"
"Que cara? Ele é meu amigo do trabalho."
"Eu sei que é a bixona com quem você tá saindo!"

Surpreso, ele percebe que (já) está envolvido
Em um barraco em público.
O cara da internet,
Além de atirado, é casado. E com uma mulher.

"Quem é você? Tá saindo com meu marido?"
Ele, sem querer envolver-se, lança leve ironia:
"Desculpa, não te conheço."
"Responde! Você sai com ele?"
Sem reação, resolveu repetir a mesma desculpa ouvida anteriormente:
"Sou amigo dele, sou do trabalho."

Um tapa dela na cara dele, mostrou que a moça não acreditou naquilo.
Envergonhado, ele levanta-se e sai,
Deixando a menina prestes a sair correndo atrás dele,
Mas, por alguma razão, prefere ficar berrando a todos,
"Volta aqui, cara! Se quer meu marido, pode ficar.
Este canalha é inteiro seu!"

Por fim, na enfermaria, ele teve de explicar a história ao segurança,
Para registrar ocorrência,
Enquanto a enfermeira fazia curativo no rosto,
Marcado com um vergão,
Vindo da aliança
Da mão da garota,
Mulher do cara,
O maduro que acabara de conhecer,
Da internet.

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Saudades

Ela, na fase adolescente,
Vivia de som alto em casa,
Cantando (gritando) junto com aquele menino no áudio.
Ele é sensação mundial.

Sua mãe, impaciente e sem conseguir concentrar-se,
Gritava em outro tom à filha, para que desligasse aquilo.
Ameaçava quebrar o som, quebrar a música (!)
Mas nada interrompia a empolgação, nem a cantoria.

Nestes dias de perda,
Em que sua adolescente teve a vida levada
Por um criminoso que utilizou a escola fluminense
Para cenário de filme de horror,
A mãe nunca desejou tanto ouvir o som alto em casa de novo.
Daria tudo para ter a filha gritando pelos cômodos.

sexta-feira, 6 de maio de 2011

Mãe

Tornou-se uma pessoa frágil.
Mas uma pessoa que amou em sua juventude,
E, depois, em seu desamor,
Perdeu até o amor próprio.

Casou-se, sem saber ao certo o motivo.
Descasou-se de mesma maneira,
Quando tudo já estava fora do controle,
Perdendo tudo, inclusive a paz de espírito.

Entre as perdas, os filhos.
Aos quais nunca pode dedicar-se totalmente:
Apenas em raras fases de tranquilidade,
Quando a cabeça não estava perturbada,
Quando o espírito não estava por demais inquieto.

No ápice de atitude de um mundo esquizofrênico,
Até abandonava seus pequenos em lugar qualquer,
Tendo-os de volta, quando um conhecido os encontrava
Chorando, em algum lugar da Cidade.

Crises seguidas.
Foi perdendo controle de tudo,
Brigava com aquele que jurara amor até a morte,
Esteve a ponto de traumatizar os filhos,
Mas foi detida antes disso.
Ou talvez nem o faria, talvez.

Sem opções, se viu obrigada a ir sozinha
Para a terra onde nasceu,
De volta à casa dos pais,
Velhos, logo a deixariam solitária, novamente.

E solitária viveu eu sua inquietude,
Sempre consigo mesma, até a hora da partida,
Quando não havia mala, nem saúde,
Sequer haviam seus filhos ao redor,
Somente ela mesma
E sua mente, seu mundo a parte,
Sua loucura.

terça-feira, 3 de maio de 2011

Impaciência

O motorista senta na cadeira,
Prepara-se e inicia a condução do ônibus.
Assim que o carro sai do ponto, um senhor faz sinal para ele,
Por pouco não perdia aquela linha.

O passageiro entra e passa seu cartão, o ônibus sai.
O cartão não funciona. Ele tenta novamente. Nada.
Recorre ao motorista, que há pouco abrira a porta a ele,
Mesmo fora do ponto.

“Motorista, meu cartão não funciona.”
“Tentou passar de novo?”
“Sim, tentei.”
“Você não teria utilizado ele há menos de 30 minutos?”
“Sei lá, eu quero passar!”

Esta resposta, atravessada,
Foi suficiente para desencadear ira no motorista.
“Você espera meia hora e a catraca libera.”
Ao que o passageiro, também estressado, responde:
“Não quero nem saber: vou passar!”
“Ah, não vai não, seu filho ******...”

Enquanto este breve desentendimento ocorria
Todos os (muitos) passageiros assistiam à cena incrédulos.
O bate boca repetitivo estendeu-se.

Até que o motorista, tão bondoso,
Ao abrir a porta ao passageiro, mesmo fora de ponto,
Mostrou-se um homem bruto e sem respeito,
E exigiu que o outro pagasse em dinheiro.

E o passageiro,
Tão gentil em agradecimentos
Àquele condutor que lhe abriu a porta,
Mesmo fora do ponto,
Agora mostra-se ignorante e intolerante:
“Não vou mesmo! Tenho cartão, tenho dinheiro, você terá de aceitar.”

No auge da briga, o motorista para o coletivo e decide:
“Só por este desaforo agora você vai sair do ônibus!”
“Não vou mesmo, eu tenho dinheiro, você não pode fazer isso!”
“Ou sai ou eu não saio com o carro.”

E o ônibus está parado na avenida e tem suas luzes desligadas.
Agora os passageiros, que até então riam,
Passam a sentir-se afetados pelo desentendimento.
O motorista fica discutindo ali por mais uns cinco minutos.
O ônibus em silêncio, no escuro, e os dois a duelarem.

Após a cena patética, digna de dois irmãos de cinco anos,
O passageiro decidiu ceder e descer.
“Desço por vocês, passageiros, que têm pressa, e não por este idiota”,
Responde o homem, que ficou sem graça de ser, de certa forma,
Causador desta confusão.
Desceu e foi esperar o próximo carro da linha.
E o ônibus saiu.

Se o passageiro não tivesse sido tão duro em sua exigência,
A de passar com o cartão, mesmo sabendo que não devia,

Se o motorista tivesse tipo mais calma em responder à agressividade
Das palavras do passageiro, afinal tinha a razão,

Se ambos tentassem utilizar-se da comunicação,
Esta ceninha infantil não teria ocorrido.

Falta paciência, falta tolerância, falta ponderação.
Falta humanismo, falta cordialidade.
Falta bom senso, falta compreensão.
Falta colocar-se no lugar do outro.
Falta.

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Bunito

Cresceu sem referências.
Criou seus próprios meios de ganhar a vida.
Uniu-se a um intrigante amor,
Passou a sofrer na bipolaridade desta união.

Apegou-se ao que é clandestino.
Desenvolveu estranhos contatos espirituais.
Ganhava a vida sobre cabeças estrangeiras,
Que em outras cidades buscavam trabalhar.
Dele dependiam suas vidas, seu dinheiro.
Suas vidas.

Não era um homem ruim, nem mal.
Dentro da ilegalidade
Tentava nunca romper o limite do caráter,
Seus atos eram em nome da sobrevivência,
Pois a vida, implacável,
Cobra força de quem se dispõe a vivê-la.

Como em quase todos os casos,
Em que há o anúncio de morte repentina,
Ele repensa seus atos,
Suas faltas, seus desleixos.

Busca apoio, busca segurança aos seus menores,
Que em breve sem ele ficarão.
Busca uma saída, até mesmo a que o livre da morte.
Mas é tarde. É descabido. Inevitável agora.
É como tentar afundar mortos no mar:
Eles retornam sempre à tona.

É quando quem promete ajudar,
À primeira oportunidade foge para salvar a própria vida.
É quando tudo o que mais quis evitar a seus filhos,
A repetição de sua história sem pai e sem mãe,
Ocorre, sem direito a final feliz.
Pois ele nada fez para reverter isto.

A vida crua, rude, suja, obscura.
Uma beleza que deve ser encarada da forma que se lê, que se vê.
Independente de como se escreve.

Realidade explícita, revoltante, perturbadora.
Sobretudo por ser real, sem efeitos, sem maquiagem.
É a vida sem segunda chance.
Vida dos que vivem em busca de sua referência,
Sua base, motivação, de seus ideiais, reencontros.
Até a morte.



(Biutiful, 2010, México. Direção de Alejandro González Iñárritu, com Javier Bardem)





segunda-feira, 4 de abril de 2011

Avenged Sevenfold em Sampa

Se sair às 6 horas da manhã de Praia Grande, num domingo 3 de abril foi loucura, considerando que o show seria às 20 horas, em Sampa, imagine quem chegou um dia antes, por volta das 15 horas?
Chegada tranquila, fila contornando o lado externo da casa de shows e a expectativa geral era uma: ver os caras do Avenged Sevenfold da melhor maneira possível.


Até as 18h30 teria chão, teria ainda chuva (às vezes muita, às vezes só garoa [faltou somente granizo]), chuva que molhou tênis, calças, camisetas e até o próprio Credicard Hall, por fora e por dentro, refrescando a pista com pingos de goteira durante a apresentação toda.




Mas nada, nada disso, atrapalhou ou causou alguma decepção à essência da noite (definitivamente): o show.

E que show!

Quem estava em uma das pistas (Premium ou Comum) sabia que se escolhesse um lugar bem próximo da grade teria de ser forte e paciente com os empurrões. E não foi por menos.

Primeiro, ninguém entendeu o link, mas houve um momento de "The sound of Silence" de Simon & Garfunkel (Leando e Leonardo fizeram versão), antes de começar o show mesmo. A canção é boa, conhecida, mas deixou um ar de "qual o motivo de fazer o pré show com ela?".
Passado o momento "what??" foram ouvidos os primeiros toques de "Nightmare". E a pista ficou louca. O pessoal pulava muito, muito mesmo. Logo na primeira música se viu o que seria fato durante toda a noite: não seria possível ouvir a voz do vocalista M.Shadows (Matthew Sanders), nem cantando nem "conversando" com o pessoal, que sem entender (o inglês e/ou por não ouvir) só berrava, concordando.
A segunda foi a que mais impressionou. Era "Critical Acclaim"! Nem começou e o pessoal somou as puladas às empurradas e também às "brincadeirinhas de luta", o que uns chamam de bate cabeça, roda punk...etc, etc. Não pude contar quantos pisões, cotoveladas levei ou quantas vezes achei que tinha perdido meu tênis no chão. Assusta para quem não é experiente nisso. Importar-se com o desodorante vencido das pessoas ao lado não era possível, claro. Braços, mãos no ombro, passadas de mãos em lugares diversos do seu corpo também não poderiam ser censurados, afinal, tinham outro objetivo: chegar o mais próximo do clique perfeito, da visão clara. Havia uma mãe e um filho de sete anos na minha frente. Realmente fiquei preocupado com o que aconteceu com eles depois, pois nem sinal da dupla após a música.
A partir da terceira canção, uma que parece que o pessoal decorou a letra inteira, a tranquilidade foi maior (o que seria visto dali em diante). O coro foi ouvido do início ao fim de "Welcome to the Family". Incrível. A introdução foi dada por uma variação energética, claro, da bateria. O atual responsável pela batera (o oficial era o Jimmy Sullivan - The Rev, que morreu em 2009) é o Arin Ilejay, um cara baixo, magrelo e de 23 anos, que ficava o tempo todo escondido atrás das caixas e pratos. Quem tinha um pé atrás pelo novato na banda, se surpreendeu com a atuação empolgada, responsável e empolgante. Só o cabelo que parecia sair da cabeça dele às vezes, pois ele mexia demais ela!
Os guitarristas Zacky Vengeance (Zachary Bake) e Synyster Gates (Brian Haner) causam sempre admiração, principalmente daqueles que tocam o mesmo instrumento e neles se espelham. A dupla usou e abusou do praticável sempre presente nos shows do A7x (como um caixote para subir e ficar mais evidente e visível). A imagem, além do som, era bela - pense a soma de um guitarrista canhoto e o outro destro, lado a lado. O efeito visual é muito interessante. O baixo Johnny Christ (Jonathan Seward), mais recente dos integrantes da antiga, é sempre discretão no modo de tocar (diferente de seu visual sempre moicano e desta vez de blazer branco). Enquanto toca ele sempre fica atento aos demais companheiros, principalmente o baterista, como se fosse um elo que toca sua parte e sente o que se passa com o outro.







O show, previsto para início às 20h (casa foi aberta às 18h30), começaria com pouco mais de meia hora de atraso, quase nada. Curtíssimo, mesmo com doze grandes sucessos, o tchau de M.Shadows foi dado às 21h54, pouco mais de uma hora de show. Ao mesmo tempo deixou sensação de satisfação completa, mas o sempre sentimento de poderia ter mais umas três quatro músicas. A passagem foi relâmpago e explosiva. Única e inesquecível para quem ali esteve. E acredito que para ambos os lados: palco e público.

O show foi perfeito para mim. Não me arrependi em nada em ter pago as centenas de reais que paguei para ver. Muitos dizem que tudo estava perfeito com o Credicard Hall, mas não estava. É fato que não se podia ouvir M.Shadows cantar, em quase 80% do show. O público abafou o tempo todo, cantando em cima. Os intrumentos ouviam-se bem, mas não o vocal (isso porque Shadows nunca tem problemas com potência de voz). Isso era tão certo, que mesmo quando Matt falava, distorcia tudo. Não se podia entender perfeitamente o que ele perguntava, pedia, comentava. Somente em partes. Mas era problema técnico. Som baixo.
A casa lotou, mas a Pista Premium não. Fato estranho, pois este espaço vip foi concorrido e motivo de revolta de muitos, que não encontravam mais ingressos para ela. Muitos queriam que o show tivesse sido em lugar maior do que o das sete mil pessoas do Credicard Hall, até mesmo um estádio de futebol. Para mim, se fosse em estádio, eu não iria, ainda mais sendo o primeiro show que fui deles. Se fosse num estádio eu não conseguiria chegar tão perto do palco como em São Paulo. Se fosse num estádio eu teria de dormir pelo menos dois dias na fila para conseguir lugar razoável, mesmo pagando caro. Enfim, lugar pequeno foi melhor, para contato próximo.
Fui sozinho, conheci gente no caminho, na fila, mas na hora das músicas foi cada um por si. Naquela multidão era difícil manter um grupo unido. Foi chato ficar sozinho na fila de espera, mas faz parte. As melhores experiências que vivi foram assim, comigo mesmo.
Outra coisa chata do Credicard Hall é a combinação palco baixo e pista reta (poderia ser levemente inclinada vertendo para o palco). Adicione estas condições aliadas a todas as mãos possíveis bloqueando os olhos, fazendo o símbolo do "diabo". Nada favorece a visão boa de quem está tocando. Se não fosse o praticável, para vê-los era necessário ponta dos pés ou empurrões para chegar à frente. Estou falando de alguém que tem 1,75 de altura (considerada altura normal), imaginem meninas, adolescentes bem menores? A pista poderia ser inclinada, o palco deveria usar elementos que deixasse a visão bem mais fácil. Neste ponto ganhou quem estava mais distante, porém em nível acima do palco, nos camarotes, ao fundo.



Mas o problema com som da voz só não foi tão sentido, pois o pessoal foi preparado para cantar quase todas as músicas. Havia horas em que os vocais de apoio deixavam para a plateia fazer suas partes. E funcionava.
Toda a banda mostrou-se super conectada, às vezes até meio no atomático, mas o resultado que vinha para todos era perto da perfeição. Shadows interagia muito com todos. Pegou bandeira do Brasil com desenho de caveira e diversas mensagens, mandava até beijo para aquelas que diziam que o amava e fez uma cara de piada quando jogaram uma camiseta deles mesmos para ele.
Uma pausa enorme foi dada após a canção "Unholy Confessions". Na típica cena onde parece que acabou o show, neste caso, todos sabiam que eles estavam devendo pelo menos duas canções (queriam uma terceira, mas eles não tocaram). E assim foi. O desfecho durou muito, mais de 20 minutos. "Fiction" e "Save Me" arrepiaram. Por serem mais lentas, o público não gritou tanto e o vocal pode ser evidenciado. Enquanto sabia-se que era o fim daquela passagem curta dos A7x, era hora de curtir as canções novas que não vinham sendo executadas.
Após a "Save Me" de dez minutos, o "Muito obrigado!" e o "Tchau" encerrou aquela visita alucinante a São Paulo. É óbvio que espera-se o retorno dos caras o mais breve possível.

Esta foi a lista de músicas da noite paulistana:
Nightmare
Critical Acclaim
Welcome To The Family
Buried Alive
Beast And The Harlot
So Far Away
Afterlife
God Hates Us
Bat Country
Unholy Confessions

(Foram "embora", mas voltaram)

Fiction
Save Me

Agora, boa sorte aos curitibanos (PR), no dia 6, e aos de Porto Alegre (RS) dia 7.

domingo, 6 de março de 2011

Profissional

Ele é um menino bem esperto.
Desde cedo sempre ajudou a vizinhança,
Cortando grama daqui,
Pintando uma grade ali.
Ele até encontra adubo animal e traz para as plantas das donas.
Em troca, recebe sempre uns trocados,
Questão de recompensa, troca, contribuição.

Outro serviço que faz bem é sumir com gatos indesejados.
Então, sempre que um gato aparece na casa,
Chamam o menino para se livrar dele.
Ele consegue sumir com eles,
E ainda leva uns reais.

De uns tempos para cá um dos moradores tem notado,
A constante presença de gatos pequenos em seu quintal.
Do nada aparecem, sempre.
É quase certo que seja o menino do bairro.
Que, tão bom em dar sumiço nos gatos,
Também deve estar trazendo-os de volta,
Para, assim, ganhar trocados,
Com sua especialidade.
Dar "sumiço" nos bichanos.

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Frustração alheia





Com tantas obras cinematográficas, tantos temas já batidos, toda vez que se vê um título como este, acredita-se que já se viu de tudo. Mas não é sempre assim. O filme ‘O vencedor’ (The fighter, de David O. Russell, 2010) é de surpreender qualquer baixa expectativa que leve a pensar “é um filme de um fortão que luta, luta e quer ganhar a competição de sua vida”. Sim, em o ‘Vencedor’, mais um concorrente ao Oscar 2011, a ideia é semelhante sim, mas com significados diferentes – o tipo de luta que o atleta enfrenta.
Na tela, um cara de talento, porém muito passivo dentro da sua família, não consegue dizer não a eles para seguir suas escolhas, atrasando seu potencial e suas possibilidades de futuro. A família, de (muitos) membros intrometidos, problemáticos, é vinda de uma trajetória de frustração ou simplesmente da situação ‘vivendo-no-sofá-esperando-o-sucesso-chegar-à-porta”.
Este é um drama filmado de forma muito simples, mas envolvente, que faz qualquer telespectador ficar, no mínimo, revoltado e indignado com a situação enfrentada pelo lutador Micky Ward (feito por Mark Wahlberg, do tosco ‘Boogie Nights’ e do bem falado ‘Os infiltrados’). Micky cresceu vendo o irmão mais velho lutando em diversos ringues, tomando-o como exemplo. O problema é que este irmão, apesar de parecer o contrário, nunca, de fato, contribuiu para que sua carreira desse certo. Na verdade esse irmão nunca chegou ao auge na luta, por ter se rendido às drogas e assim projetar toda a falta de sucesso no irmão menor, tentando assim, se reerguer às custas dele. E não só o mais velho, mas toda a família cai em cima do protagonista.
A situação chega a um ponto máximo e desolador para Micky. E todos que assistem sentem-se atados assim como o lutador. Mas boas histórias de fracassos contam com pessoas que sempre aparecem no caminho, mostrando que era preciso e possível reagir. É quando ele encontra-se no ringue novamente, porém lutando sua própria luta.
Sequências de embates muito emocionantes, sem ser apelativas ou violentas – até são capazes de arrancar lagrimas. É o retorno por cima, incrível. Não é só a luta, não somente brutalidade: é a superação na vida, seja lutador ou garçonete de bar. E mais – a superação de um fracasso (descobre-se) que não era seu, mas de outro. Algo muito parecido ao efeito “mãe fracassada que pressiona o sucesso da filha” visto no ‘Cisne Negro’.
É dica válida, inclusive, porque não, para estar entre os favoritos. É absorvível em sua simplicidade. É linear e correto e cumpre a mensagem que se dispõe a passar.


quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Aquele que tem a voz





Problemas todos têm. Conflitos e traumas carregados, qualquer um está passível de ganhar. Agir é a saída, mas nem sempre o caminho mais fácil. Apoio é fundamental, mas nem sempre é oferecido ou quando se apresenta é transformador demais, joga verdades na cara e causam medo num primeiro momento, até, por fim, ser recebido e aceito.
‘O discurso do rei’ (The king's speech, 2010, Tom Hooper) é um dos favoritos na corrida pelo Oscar 2011 e faz por merecer quase todas as 12 indicações que possui. Uma ótica diferente e suave ao extremo. Um filme que passa serenidade quase que infantil, transita entre cenas que beiram o cômico de bela sutileza e a sensibilidade tal qual a de quem sofre de gagueira. Muito claro, direto e sem abordar o épico de forma pesada.
Um filme que trata de um problema difícil de ser enfrentado, sobretudo a um ícone da política de seu país. É a gagueira que se apresenta em momento em que a voz se faz mais do que esperada: é fundamental para a situação vivida de prenúncios da guerra. Destaques: para as cenas muito bem elaboradas de ângulos levemente acima da cabeça do rei (fotografia de Danny Cohen), mostrando uma autoridade em suas aflições, desafios e medos, sem ser apelativo; e destaque ainda para a junção perfeita entre o principal Colin Firth (rei George VI) e seu polêmico ajudante Geoffrey Rush (o fonoaudiólogo nada convencional Lionel Logue). A atriz que faz o papel de esposa do rei, Elizabeth (Helena Bonham Carter), aparece de forma notável, discreta, mas marcante, muito longe das mulheres exageradas e exóticas de "Sweeney Todd - O barbeiro demoníaco da rua Fleet", "A fantástica fábrica de chocolate", "Alice no país das maravilhas", além dos "Harry Potters".
Filme válido, mensagem direta e obra muito feliz ao abordar de forma serena (sem dramalhões de arrancar lágrimas ou agitar as cenas num quase suspense) problemas que são o terror e constrangimento para muitas pessoas.

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Para não se reprimir



Enrique Martins Morales, de Porto Rico, quase 40 anos. Uma vida considerada, sim, de sucesso, desde a infância. Recentemente se viu no desafio de se abrir para o mundo e revelar segredos antes temidos até mesmo por ele. Antes disso, um turbilhão de acontecimentos, ocorridos, altos, baixos...

Pelos rumores antes do lançamento do livro "Eu" (2010, pela Planeta), onde o cantor Ricky Martin abriria sua vida (ou parte dela), muitos puseram-se a esperar uma obra biográfica que revelaria um lado promíscuo e altamente sexual de um cantor recentemente assumido gay. Mas o astro pop contrariou as cogitações.

Mesmo sendo sempre referência de cantor latino, sensual, erótico ou sucesso entre as mulheres, em seu 'Eu', Ricky traz uma versão de si mesmo bem mais íntima, mais de casa, mais real, bem mais ao estilo Kiki (forma como é conhecido entre os seus). As páginas guiam o leitor para outros fatos, talvez tão ou mais importantes do que a saída do armário do ex menudo, como a contratação de uma barriga de aluguel, que lhe deu uma dupla de meninos.

A trajetória de sua carreira é bem descrita. Disco a disco, show a show. O sucesso em seu país, depois nos EUA e até chegar a representante numa copa do mundo.
Coisas simples atraem pela sinceridade, como o fato de sentir-se inferior, por seu inglês com sotaque fortemente latino, que quis mudar a todo o custo. Hoje ele vive entre casas na duas Américas, a Central e a do lado Norte.

Se alguém acha que vai encontrar relatos de tirar o fôlego de transas com homens (e também com mulheres), engana-se; se procura relatos mega dramáticos sobre sua decisão de assumir-se gay, não o encontrará, nem lágrimas sequer; se acha que será um diário com fofocas do meio artístico desde a época do grupo pop latino, melhor esquecer.

'Eu' é simples, mas é uma ótima leitura para quem quer aprender sobre questões da vida, como aproveitar cada dia, dar valor a coisas pequenas do cotidiano; saber dizer não quando a vida de artista insiste em apagar a vida pessoal; ou como saber dizer sim, ao seguir seus desejos, vontades e posições (esse assunto não é novidade no mercado literário). Além disso, é um rico relato sobre desafios enfrentados em nome da busca pela fama e reconhecimento de seu trabalho. Discos que eram gravados de forma louca enquanto cumpria agendas em todo o mundo, além das dúvidas sobre si mesmo, tudo, tudo ocorrendo ao mesmo tempo.

'Eu' é um testemunho pela vida, pela busca da realização interior, pelo encorajamento (não somente de gays a assumirem sua sexualidade reprimida e mal vivida). É um livro de ajuda, sem ser piegas demais, pois a escrita de Ricky passa sinceridade até mesmo àqueles que já no início da leitura se aborrecem com algumas repetições de narração, que na verdade são retomadas de uma assunto, para explicá-lo melhor e contextualizá-lo com o fato que viria adiante. Aliás, estas retomadas são constantes e dão a nítida impressão de que Ricky está sentado de frente para quem o lê, contando cada detalhe, de forma tão simples, que faz com que a leitura seja até mesmo considerada sem sal, sem fatos radicais, com declarações que nem fazem chocar. Nada, nada é abusivo, gratuito ou apelativo. Tudo é sobre família, sobre alma, sobre espiritualização, aceitação, agradecimento à vida, à família e à vida novamente.

Uma leitura válida. Pode ser tida como fria e ficar distante dos melhores livros lidos nos últimos tempos. O que seria um diferencial? Talvez nem haja. Ele ser artista latino, que gravou seu nome e identidade no mundo? Talvez. Seria o fato dele ser considerado sexy symbol das mulheres, mas os relatos mostram que ele sempre preferiu os homens? Quem sabe.

Enfim, a leitura vale ainda assim. Vale pela curiosidade e pela (novamente) sinceridade. Justamente por sair do óbvio, por sair do "cantor pop fala abertamente sobre a lixeira do mundo de um artista pop". Mesmo. Mas desde que se leia sem esperar sensacionalismo, sexo explícito, contos vulgares e etc. Desde que se saiba que está a ler um humano que abre o que há de mais forte em sua vida: suas crenças, pelas quais valeu, de acordo com ele, lutar até o final.

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Sem ninguém para recorrer







Uma regra que se aprende no lar é nunca sair sem dizer para onde se vai, com quem estará, a que horas voltará. Muitos não se dão conta, mas estas precauções são primordiais, tendo em vista que a partir do momento em que se acorda, qualquer um está passível de passar por qualquer situação, que, em alguns casos, pode alterar radicalmente a vida que se leva. É quando o dito popular "para morrer basta estar vivo" tem real significado e probabilidade de acontecer, a qualquer um, em qualquer dia, hora.
O filme "127 Horas" (127 Hours), agarra-se a uma ideia absurdamente simples para conduzir o pouco mais de uma hora e meia em tela. A direção é de Danny Boyle, que dispensa apresentações. Basta dizer que o cara é aquele que causou revolução em "Quem quer ser um milionário?" (Slumdog Millionaire, 2008). Em '127' a assinatura dele aparece nos primeiros segundos. Seu dinamismo e inovação são brilhantemente óbvios no longa, tanto na adoção de divisões da tela em duas e três cenas ao mesmo tempo, ou trazendo, novamente, o maior criador de trilhas sonoras do maior mercado de cinema (a Bollywood), o indiano A. R. Rahman! Parceria fantástica.
A trama gira em torno de um aventureiro incorrigível, o Aron Ralston (James Franco, de "Milk”, 2008) , que, em certos momentos, abdica até um pouco de sua vida social, para viver solitário em montanhas e lugares onde explora seu espírito radical. Este alto conhecimento e segurança no que faz é fundamental para o progresso de sua atividade, sua exploração, descoberta e aprendizado, mas também torna-se seu mal - excesso de segurança rouba certa parcela de atenção a coisas simples que podem caracterizar-se em riscos e acidentes fatais.
A simplicidade está no desenrolar. Em '127' Aron está preso em um local de difícil acesso, onde ele até poderia descer um nível a mais e caminhar rumo à saída de baixo e assim chegar a seu carro e retornar para casa. Mas isso não é possível. E aí está toda a tensão. Apesar de trazer clichês típicos (o sofredor que se vê obrigado a ingerir sua própria urina, água de chuva e manter a bateria de sua lanterna, para assim manter-se vivo) '127' traz o quesito “a mais“. O escalador tem sua mão presa a uma pedra que tem 1/4 de seu tamanho, impossível de ser removida. Impossível.
Com essa condição, realmente impossível de se soltar da pedra, Aron tem tempo para repensar sua vida, que vem para ele em falas antigas, como num filme, onde ele sabe de cor cada texto que agora repete, como um perfeito dublador de si mesmo. Como ele sairia dessa? Será que realmente iria sair? Esta é a pergunta chave.
Um filme exremamente dinâmico (coisas de Boyle).
É iluminado, fresco, jovem como a jovialidade do protagonista James Franco. Lindo como um dia ensolarado de céu cristalino em azul. Não é depressivo, embora motivos não faltassem. É para cima, positivo. Destaque para a trilha sonora, que sequer se aproxima daqueles violinos estridentes, trêmulos, em estacatto, que aparecem em momentos de alta tensão e pânico. Aqui impera a sonoridade de raiz que somente A. R. Rahman traz. Batidas, tom espirituoso, desafiante, tanto quanto a cena da qual se torna fundo.
Válido, '127 Horas' é surpreendente e inesperado. Tão inesperado quanto o relato de desmaios na plateia, durante primeiras exibições em Toronto. Tão inesperado quanto o fato d'ele ser baseado em fatos reais. Muito reais.

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Benefício da dúvida



"O preconceito obscurece a verdade"

Você já foi julgado injustamente?
Já julgou alguém sem antes vestir-se em sua pele?
Quantas vezes você pensa muito bem antes de sair culpando alguém, ou pior, incriminar alguém?
Em determinadas vezes você consegue assumir que seu preconceito cria uma barreira na sua análise sobre um fato ou pessoa?
Você é capaz de deixar seu preconceito de lado para decidir se alguém é culpado ou inocente?

Doze homens de um juri têm a missão de analisar um possível homicídio em família e decidir o destino de um rapaz de 18 anos. Liberdade ou pena de morte. O acusado é pobre, estrangeiro e é julgado nos Estados Unidos.

Trata-se do filme “Doze homens e uma sentença”, do original “Twelve angry men”, de 1957, de Sidney Lumet. O filme é impressionante de cara por um motivo que vai contra as obras recheadas de tecnologia que há hoje: ele é inteiro passado somente em uma sala com uma grande mesa no centro. E pronto. Tudo em branco e preto.

O grupo de jurados já entra na sala, de onde sairá o veredito, com a certeza de que o jovem em questão é culpado por ter matado seu pai. O trabalho parecia simples e acabado! Mas o jurado número 8 não tem esta certeza. E por causa dele, todos os demais devem: tentar convencê-lo a mudar de ideia, com o motivo pelo qual decidiram por culpado, e/ou devem ouvi-lo e, se julgarem correto, modificarem suas opiniões.

Seu voto de ‘não culpado’ se deve não por ele ter pena do acusado ou por estar certo da inocência dele. Seu voto é simplesmente por ele não ter certeza de que o julgado é culpado, pois as provas e testemunhos apresentados não são totalmente críveis. Com a ideia de questionar, assim como fazem as crianças, quando querem saber ‘porque’, o oitavo jurado pergunta o motivo pelo qual levou todos os onze a defender que o rapaz é culpado. A resposta vem. Aparecem os que sequer sabem defender o voto que deram.

A partir daí, entra a grande sacada do filme. Uma análise muito criteriosa sobre fatos, depoimentos e probabilidades, leva à constatação de que os testemunhos eram deficientes.
Mais adiante, a briga entre eles causa a queda de suas próprias máscaras. Um se revela preconceituoso social, por conta da origem humilde do rapaz (algo do tipo ‘ele vive numa favela e é criminoso’); outro se ofende, pois viveu neste mesmo cenário de probreza, mas se envergonha de contar detalhes. Outro se mostra totalmente ignorante, quando, em suas prioridades naquela mesa, está a de terminar o julgamento o quanto antes, pois tem uma partida esportiva para logo mais à noite e não quer perder por nada (todos os membros do juri só saem com veredito em mãos).

Todos estes elementos apresentados por aqueles que teriam a responsabilidade de julgar alguém, estavam contra os princípios da justiça, que é o julgamento com o máximo de exatidão, certeza e imparcialidade possíveis.

Então, os relatos, meticulosamente analisados, caem por terra de forma deliciosamente óbvia. Fatos desmascarados que levam o expectador a pensar “Nossa! Eu nunca atentaria para este detalhe, se estivesse no lugar dele”. O veredito fica mais enrolado, provando que, assim como no cotidiano de qualquer um, age-se sem pensar, julga-se sem analisar todas as possibilidades. E, assim, erra-se feio. Mas este tipo de erro é o que o oitavo jurado tenta evitar, pois o preço, naquele caso, seria a morte ou a libertação do acusado em questão.

"Doze homens e uma sentença" estimula ainda a reflexão sobre uma situação assustadora, que pode ser trazida para a atualidade brasileira: a justiça (em diversas esferas, não somente na de leis) está, muitas vezes, nas mãos de tolos, de chantagistas, de despreparados ou até mesmo de pessoas que não se importam de fato com um julgamento necessariamente correto, mas apenas com o que consideram justo (distorcida por conta de preconceitos e outros sentimentos viciados).

Doze homens é filme único, algo como obra rica para se ter e recomendar ao amigo. Feito todo em uma sala apenas, mas que não deixa, nem por um minuto, o observador entediar-se no sofá. Diálogos elaborados, que levam cada um que assiste a, inevitavelmente, querer participar dos raciocínios, soltando um “É verdade!” ou um “Ele está certo mesmo!”.

Vale a pena conferir as reviravoltas de um único caso, até chegar à sua conclusão!

Culpado ou inocente?

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

29 anos sem Ela

"A música é meu arco, minha flecha, meu motor, meu combustível e minha solidão. Amigo, cantar é um ato que se comete absolutamente só e eu adoro."

Elis Regina
*17 de março de 1945
+19 de janeiro de 1982